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quinta-feira, 17 de maio de 2012

Das Vantagens de ser Bobo

O bobo, por não se ocupar com ambições, tem tempo para ver, ouvir e tocar o mundo. O bobo é capaz de ficar sentado quase sem se mexer por duas horas. Se perguntado por que não faz alguma coisa, responde: "Estou fazendo. Estou pensando." 


Ser bobo às vezes oferece um mundo de saída porque os espertos só se lembram de sair por meio da esperteza, e o bobo tem originalidade, espontaneamente lhe vem a idéia. 


O bobo tem oportunidade de ver coisas que os espertos não vêem. Os espertos estão sempre tão atentos às espertezas alheias que se descontraem diante dos bobos, e estes os vêem como simples pessoas humanas. O bobo ganha utilidade e sabedoria para viver. O bobo nunca parece ter tido vez. No entanto, muitas vezes, o bobo é um Dostoievski. 


Há desvantagem, obviamente. Uma boba, por exemplo, confiou na palavra de um desconhecido para a compra de um ar refrigerado de segunda mão: ele disse que o aparelho era novo, praticamente sem uso porque se mudara para a Gávea onde é fresco. Vai a boba e compra o aparelho sem vê-lo sequer. Resultado: não funciona. Chamado um técnico, a opinião deste era de que o aparelho estava tão estragado que o conserto seria caríssimo: mais valia comprar outro. Mas, em contrapartida, a vantagem de ser bobo é ter boa-fé, não desconfiar, e portanto estar tranqüilo. Enquanto o esperto não dorme à noite com medo de ser ludibriado. O esperto vence com úlcera no estômago. O bobo não percebe que venceu. 


Aviso: não confundir bobos com burros. Desvantagem: pode receber uma punhalada de quem menos espera. É uma das tristezas que o bobo não prevê. César terminou dizendo a célebre frase: "Até tu, Brutus?" 


Bobo não reclama. Em compensação, como exclama! 


Os bobos, com todas as suas palhaçadas, devem estar todos no céu. Se Cristo tivesse sido esperto não teria morrido na cruz. 


O bobo é sempre tão simpático que há espertos que se fazem passar por bobos. Ser bobo é uma criatividade e, como toda criação, é difícil. Por isso é que os espertos não conseguem passar por bobos. Os espertos ganham dos outros. Em compensação os bobos ganham a vida. Bem-aventurados os bobos porque sabem sem que ninguém desconfie. Aliás não se importam que saibam que eles sabem. 


Há lugares que facilitam mais as pessoas serem bobas (não confundir bobo com burro, com tolo, com fútil). Minas Gerais, por exemplo, facilita ser bobo. Ah, quantos perdem por não nascer em Minas! 


Bobo é Chagall, que põe vaca no espaço, voando por cima das casas. É quase impossível evitar excesso de amor que o bobo provoca. É que só o bobo é capaz de excesso de amor. E só o amor faz o bobo


Clarice Lispector

sexta-feira, 4 de maio de 2012

Fix You - Consertar Você


Quando você faz o seu melhor, mas não tem sucesso

Quando você recebe o que quer, mas não o que precisa
Quando você se sente tão cansado, mas não consegue dormir
Preso em marcha-ré

E as lágrimas escorrem pelo seu rosto
Quando você perde algo que não pode substituir
Quando você ama alguém, mas isso se desperdiça
Poderia ser pior?

Luzes vão te guiar para casa
E incendiar seus ossos
E eu vou tentar consertar você

Bem  em cima ou  embaixo
Quando você está apaixonado demais para desistir
Mas, se você nunca tentar, nunca saberá
Exatamente qual é o seu valor

Luzes vão te guiar para casa
E incendiar seus ossos
E eu vou tentar consertar você

Lágrimas escorrem pelo seu rosto
Quando você perde algo que não pode substituir
Lágrimas escorrem pelo seu rosto
E eu

Lágrimas escorrem pelo seu rosto
Eu te prometo que aprenderei com meus erros
Lágrimas escorrem pelo seu rosto
E eu

Luzes vão te guiar para casa
E incendiar seus ossos
E eu vou tentar consertar você

Coldplay

domingo, 1 de abril de 2012

Gárgulas


  Nunca encontrei um “demônio” que tivesse tanta dificuldade de esconder suas asas de anjo. Gravado em seu dorso, tem a esperança silenciosa de domar Pégaso, a fim de aniquilar sua Quimera. Na luta constante contra a frágil natureza, o que sobram são os personagens bem elaborados que formam um manto de retalhos ou uma falsa armadura de amargas convicções e com a solidão e decepções cunhou um enorme escudo; seu Dharma.
  Suas mãos pequenas e ressecadas pelo seu labor diário pedem carinho de forma despretensiosa, como se quisesse encontrar nas minhas um Braille com respostas para suas dúvidas inconfessáveis.
  Transformou seu corpo em uma alcova da alma, que por desesperança se comunica através de seus olhos negros e invasivos, aos olhá-los diretamente penetram na minha alma como dardos.
  Antagônica; faz seu leito de frieza no abismo e se aquece ao abraçar seu anjo-fruto que cultiva seus sonhos mais profundos e palpáveis.
  Existe a diferença entre os que vivem a cada dia como se fosse o último, e os que os que acordam como se fosse o primeiro de suas vidas.
  Um dia em uma das minhas últimas despedidas vi a sombra de sua alma passar por mim e em sussurro mudo, com seus lábios colados aos meus, pensei ter ouvido “eu te amo.”
  Tornamos-nos suspeitos de um crime que não chegamos a cometer...
  Por mera distração, sem intenção, tudo que fiz foi confessar, e em minhas ambições me transformei em seu algoz; em tudo que teme..., talvez deva ser assim..., yin e yang convivem, mas são opostos em seus pólos.
  Sei que não me encaixo em seus sonhos e nem em sua lista de amistosos abraços matinais...
  Assim tudo se resume entre: “o que é”, “o que ninguém quer ver”, “o que poderia ser” e “o que gostamos de ver”.
 Agora colherei o salutar descaso..., e ainda me pergunto por que não tentei fugir?!...
 Quem sabe um dia qualquer, num desses encontros casuais, talvez a gente se encontre e eu te chame de minha amiga e encontre uma explicação...
...Tenho saudade do texto que não li em um cartão que nunca recebi que dizia: “Você é especial p’ra mim.”
...Tenho saudade do tempo que era bem-vindo à mesa.
  Alguns milagres quase se realizam...
  Nem tudo o fogo consome...
  Até mais...

Leandro Ribeiro